A eterna ofensiva anticorrupção de Xi Jinping na China
No final de abril, a Assembleia Popular Nacional (APN) da China, Parlamento de fachada da ditadura comunista, anunciou a expulsão de quatro dos seus membros por suspeitas de “violação da lei e da disciplina”. Um dos expulsos foi o cientista Yang Xiaoming, criador da primeira vacina contra a Covid-19 aprovada no país asiático.
Foi apenas um dos casos mais recentes da ofensiva
anticorrupção empreendida no Partido Comunista da China (PCCh) desde que o
ditador Xi Jinping assumiu o posto de secretário-geral da legenda, em novembro
de 2012, e depois de líder do país, em março do ano seguinte.
Como a maioria dos chineses em posições de destaque são do PCCh, os expurgos abrangem cada vez mais setores da sociedade e da economia chinesas, como bancos, forças armadas (incluindo o programa de foguetes chinês), saúde, telefonia, energia e tecnologia – sempre seguindo um padrão misterioso de desaparecimentos súbitos, que inclui apagar registros da pessoa visada dos sites dos órgãos onde trabalharam.
O site Politico comparou a ofensiva anticorrupção de Xi aos
métodos do paranoico ditador soviético Josef Stálin, cujos expurgos no Grande
Terror, entre 1936 e 38, levaram à morte de centenas de milhares de pessoas
(algumas estimativas apontam mais de 1 milhão de vítimas), executadas ou que
perderam a vida em campos de prisioneiros (os chamados gulags), muitas delas
ex-aliados na cúpula comunista.
Nos primeiros dez anos da campanha chinesa, foram investigados
4,7 milhões de membros do PCCh. Apenas em 2023, cerca de 610 mil integrantes da
legenda foram condenados por corrupção.
Analistas ponderam que há realmente muita corrupção no PCCh,
mas que a ofensiva infinita de Xi também tem motivações políticas, com o
objetivo de consolidar poder e impedir que outras lideranças ameacem destroná-lo.
“Xi pode ser paranoico
em relação à corrupção de alto nível, mas o seu medo não é um delírio”, disse Andrew
Wedeman, coordenador de estudos sobre a China na Universidade Estatal da
Geórgia, em entrevista à BBC. “A corrupção que ele teme é certamente real. [Mas]
é provável que também seja verdade, claro, que Xi capitalizou a repressão para
obter vantagens políticas.”
Em março de 2023, ele foi “reeleito” (termo aqui usado de
forma irônica, pois a China é uma ditadura de partido único) para um terceiro
mandato de cinco anos, o que o tornou o líder mais poderoso do país asiático
desde o tirano Mao Tsé-Tung.
O ditador já sinalizou que a campanha anticorrupção não tem
data para acabar. “Embora tenha havido uma vitória esmagadora no esforço
anticorrupção que durou uma década, a situação continua complexa”, declarou Xi
em janeiro. “Diante de uma situação tão complexa, não pode haver interrupção,
afrouxamento ou transigência no combate à corrupção.”
À CNN, Alfred Wu, professor associado da Escola de Políticas
Públicas Lee Kuan Yew da Universidade Nacional de Singapura, concordou que a
repressão não vai terminar tão cedo.
“Xi menciona algumas questões urgentes, como a corrupção
muito profunda na economia. É para um público interno, para garantir que as
pessoas saibam que a campanha anticorrupção é a principal prioridade”, afirmou.
Porém, na entrevista à BBC, Andrew Wedeman destacou que uma
ofensiva aparentemente sem fim, ao invés de impressionar a população, tende a
torná-la mais cética sobre sua eficácia.
“Colocando de uma forma simples: se você passa uma década
travando uma batalha de ‘vida ou morte’ contra tigres [termo que a ditadura
chinesa usa para se referir aos corruptos de alto escalão] e, dez anos depois,
você está caçando uma quantia igual à de quando começou, isso sugere fortemente
que você não está conseguindo caçá-los até a extinção e talvez nem tenha
reduzido significativamente seus números”, disse o professor.
Ou seja: a força política da caça às bruxas de Xi pode estar com seus dias contados. (Com Agência EFE)