Sem esquecer passado, cerimônia reflete promessa d…
Depois de uma edição de Jogos Olímpicos sem público e repleta de restrições por conta da pandemia, em Tóquio 2020, nada mais justo do que Paris levar a cerimônia de abertura para o ar livre, passeando por monumentos históricos e pontos da Cidade Luz – em uma explosão de cores que nem mesmo a primeira chuva em uma festa de abertura em 70 anos foi capaz de segurar.
A chuva gerou, de fato, algumas cenas bizarras, sobretudo quando havia mistura de cenas ao vivo e performances pré-gravadas (com o céu mais claro e nenhuma gota caindo), mas nada que estragasse a magia da celebração mais ambiciosa dos 128 anos de história das Olimpíadas modernas. Em vez de trancafiados dentro de um estádio, os mais de 10.000 atletas navegaram por barcos ao longo do rio Sena, aplaudido por espectadores espalhados por pontes, varandas e arquibancadas.
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A festa como um todo refletiu bem o compromisso do Comitê Olímpico Internacional por Jogos mais inclusivos e diversos. O ponto foi ressaltado, em alto e bom som, no discurso do presidente da organização, Thomas Bach, que prometeu jogos mais sustentáveis, mais jovens, inclusivos, e os primeiros com igualdade de gênero nos esportes – a proporção neste ano é de uma atleta feminina para cada atleta masculino competindo.
As mulheres tiveram, inclusive, um momento só para elas. Ao som da Marselhesa, o hino nacional francês, dez estátuas douradas de mulheres icônicas da história da França “brotaram” do Sena. Segundo os organizadores, um dos objetivos é dar destaque também a uma diferença histórica: há cerca de 260 estátuas de homens espalhadas pela cidade, mas apenas cerca de 40 de mulheres.
Uma das homenageadas foi Simone Veil, primeira mulher a presidir o Parlamento Europeu (1979-1982) e, enquanto ministra da Saúde da França, defendeu o projeto que despenalizou o aborto no país. Hoje, a interrupção da gravidez é um direito incluído dentro da Constituição. As outras mulheres escolhidas foram Olympe de Gouges, Alice Milliat, Gisèle Halimi, Simone de Beauvoir, Paulette Nardal, Jeanne Barret, Louise Michel, Christine de Pizan e Alice Guy.
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A diversidade veio também nos atos musicais, passando do dance music e heavy metal a um medley de cabaré de Lady Gaga (que cantou a música “Mon Truc En Plumes”, dos anos 1960), seguindo para a estrela pop franco-maliana Aya Nakamura, a artista francófona mais ouvida do mundo, que cantou acompanhada pela orquestra da Guarda Republicana Francesa.
Vale ressaltar também o momento da festança reservado a um gesto de homenagem aos trabalhadores envolvidos na reconstrução da Catedral de Notre-Dame. Dançarinos fizeram uma performance ao som de marteladas, mesclada com imagens do prédio devastado por um incêndio em 2019.
Potente símbolo da França, a catedral se tornou o palco de variados capítulos da história — um deles a Revolução Francesa, quando se converteu em Templo da Razão e teve seus sinos derretidos para a confecção de armas. Mais tarde, revestiu-se novamente de glória quando Napoleão I a escolheu para a cerimônia em que se fez imperador, em 1804, episódio famoso por ter, ele mesmo, levado a coroa à cabeça.
Em 2019 veio o derradeiro baque: a igreja foi engolfada pelas chamas de um incêndio do qual, ao que tudo parecia, não sobreviveria. Pois mais uma vez resistiu e, agora, passa por uma profunda obra de reconstrução. A ideia inicial era reconstruí-lo até a temporada olímpica, mas, entre atrasos e polêmicas, a reabertura ficou para dezembro deste ano. Uma pena não estar pronta a tempo de presenciar mais um momento histórico de Paris.