O mais novo dilema de Macron
Debater política é esporte nacional na França, a terra da Revolução, onde qualquer fagulha logo vira uma questão incendiária. E aí vai todo mundo às ruas protestar ou celebrar, como se viu recentemente quando o Reagrumento Nacional (RN), o partido da ultradireita liderado por Marine Le Pen e seu pupilo Jordan Bardella, não obteve a tão temida maioria na votação que definiu o arranjo de forças na Assembleia Nacional.
Mesmo assim, o presidente Emmanuel Macron segue imprensado, já que a esquerda, aglutinada em torno da Nova Frente Popular, arrebanhou o maior número de assentos no Palácio Bourbon, que até virou atração turística nestes dias pré-olímpicos, com réplicas coloridas da Vênus de Milo bem na frente – tudo ao lado da arena onde o skate de Rayssa Leal, a fadinha brasileira, será disputado.
Como se não bastasse todo o enrosco, agora veio um outro ser ou não ser na dura vida presidencial: será que Macron pula no rio Sena antes dos Jogos, antes da abertura, em 26 de julho?
Ele sempre repetiu que tem a intenção de saltar naquelas águas por tanto tempo interditadas e que, agora, foram saneadas para a Olimpíada. É o maior trunfo destes Jogos, mas também um ponto de interrogação: se chover muito, acontece o que aconteceu não faz muito tempo. O aguaceiro arrastou a sujeira in natura para o rio, que, sim, ficou impróprio para banho, acendendo um alerta geral. Mas o presidente, enrolado que está, empurra com a barriga o momento do mergulho, como faz também para apontar seu primeiro-ministro, uma complexa costura em que tenta ganhar tempo.
AS MULHERES NA FRENTE
A pressa neste campo acentuou-se na semana passada. A ministra dos Esportes, Amélie Oudéa-Castéra, tomou a dianteira e saltou no Sena – o que, aliás, agilizou o cumprimento de promessa antiga da prefeita Anne Hidalgo, antagonista de Macron, que por fim deu suas braçadas ali na quarta-feira 17, na área da Île Saint-Louis.
Na sexta-feira 19, o presidente viu-se na necessidade de se explicar. O palácio Élysée soltou um comunicado afirmando que ele “nunca disse que mergulharia no Sena antes da Olimpíada, mas que iria certamente nadar lá.” Assim que tiver oportunidade, esclareceu o palácio, ele vai se banhar nas águas que serpenteiam Paris.
Ainda segundo o Elysées, em discurso de tom eleitoral, a grande preocupação do presidente é que todos os cidadãos da cidade possam dar um mergulhinho no rio após os Jogos. Se o plano vingar, será um legado e tanto. O rio está há um século fechado para banho.
O que vem acalmando as autoridades é o fato de o tempo seguir ensolarado, e não haver previsão de chuva. A prefeitura divulgou nas últimas horas um boletim que indica que, na semana de 10 e 16 de julho, o Sena estava balneável, à exceção de um único dia. Foram amostras colhidas na Ponte Alexandre III, de onde será dada a largada às provas de triatlo e maratona aquática e que faz parte do belo trajeto previsto para a festa de abertura dos Jogos, na qual o rio será o palco.
O resultado permite otimismo, mas ao mesmo tempo deixa um suspense. Antes de cada competição, a qualidade da água será aferida. A boa notícia é que o rio vem demonstrando alta capacidade de recuperação. Depois de chuvas torrenciais em 11 e 12 julho, em dois dias a água já estava própria de novo. Elas andavam revoltas, outro ponto de atenção, mas vêm baixando gradativamente.
O plano B, se tudo der errado, é transferir as provas para o rio Marne, à Leste de Paris. Mas ninguém aposta nesse detour. Enquanto isso, Macron, 46 anos, vai esticando a decisão de mostrar suas habilidades de nadador no Sena.