Por que Rebeca Andrade não olha para o placar
Logo depois de ter passado por uma daquelas provas de fogo que funcionam como divisor de águas em uma trajetória, Rebeca Andrade, que levou a prata no individual geral da ginástica artística, na arena de Bercy, em Paris, apareceu com sua medalha de prata e uma boa dose de alívio. Deu certo.
E o ouro, afinal, chegou a achar que poderia conquistar ao longo do circuito que inclui os quatro aparelhos – salto, traves, barras assimétricas e solo? Ela diz que não ficou pensando nisso, mas manteve-se centrada no dela, sem olhar o placar que pairava sobre a plateia cheia de torcida pró-Rebeca.
São duas as razões para não mirar os décimos e centésimos que a toda hora pipocam na tela. “Não olho nada para não ficar na tensão pela nota das outras. Preciso estar tranquila”, justificou. O outro motivo quem revela é gente próxima. “Rebeca é míope e não consegue enxergar aqueles números lá longe”, diz Aline Wolff, a psicóloga do COB que a acompanha.
“Sou bem humaninha”
A atleta que se tornou a brasileira com mais medalhas no currículo – e ainda têm chances de outras três nestes Jogos – conta que se sentiu bem à vontade na prova, sob o controle de corpo e mente. “Pensei em cada movimento que fiz”, relata.
Normalmente, Rebeca prefere não olhar a exibição das colegas de tablado – mais uma de suas estratégias para espantar a ansiedade -, mas desta vez resolveu ver tudo. Por quê? “Queria ter a experiência completa, estou em Paris.”
Aí veio à tona o assunto Simone Biles, a extraordinária ginasta que conquistou o ouro, o sexto de sua bem-sucedida carreira. Alguém menciona a americana como “extra-terrestre” e logo Rebeca reage: “Extra-terrestre? Não. Eu sou bem humaninha.”
Quando toda a batalha pelo pódio terminar, aliás, é o mais humano dos desejos que a dona da prata acalenta: “Só quero ver os meus cachorrinhos.”